As prisões de um delinquente rebelde: João Pereira Lima, 41 anos como reincidente genérico e incorrigível
DOI:
https://doi.org/10.14295/rbhcs.v15i31.16041Palavras-chave:
Criminologia, Positivismo, João Pereira LimaResumo
Este artigo investiga os efeitos práticos do discurso médico-positivista nas avaliações criminológicas de João Pereira Lima ao longo de seus 41 anos de prisão em diversas instituições de privação da liberdade do estado de São Paulo. Ao recuperar sua experiência de encarceramento a partir dos prontuários produzidos pelo Instituto de Biotipologia Criminal (IBC) da Penitenciaria do Estado de São Paulo, investigamos as relações entre as teorias criminológicas e a construção de sua identidade institucional como um indivíduo de personalidade psicopática e perigosa. Demonstramos como a construção de sua imagem como um delinquente rebelde contribuiu para um processo de estigmatização, sofrido dentro e fora da prisão, e resultou no prolongamento de suas penas. Inserido nesse universo da operação discursiva da designação, Pereira Lima se fez narrador de sua própria trajetória ao publicar uma autobiografia nas páginas do jornal Última Hora nos primeiros meses de 1964. A partir dessa escrita de si, encaminhamos a conclusão do artigo demonstrando como, ao assumir-se autor da narrativa de sua própria vida, Pereira Lima revela capacidade e desejo de reconstruir sua identidade de modo a se contrapor àquela estabelecida pelo saber médico.
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